Maria do Espírito Santo da Silva foi uma liderança rural assassinada em Nova Ipixuna, no estado do Pará, Brasil, em 24 de maio de 2011. Ela e seu marido, José Cláudio, foram assassinados a tiros por pistoleiros, em uma emboscada na estrada que leva ao Projeto de Assentamento Agroextrativista Praia Alta–Piranheira, onde moravam. Os corpos do casal foram encontrados dentro da reserva natural Praialta-Piranheira, onde eles haviam trabalhado em defesa da floresta e dos direitos humanos por 24 anos.
Ambos eram lideranças locais do Projeto Agroextrativista Praia Alta–Piranheira, onde vivem cerca de 500 famílias. Durante anos, eles haviam recebido ameaças de morte como resultado do trabalho que desempenhavam em defesa da floresta e dos direitos humanos por parte de madeireiros, carvoeiros e criadores de gado da região. Esse tipo de desmatamento ilegal segue constantemente avançando na área do Projeto de Assentamento para extrair espécies nobres de madeira, como castanheiras, angelim e jatobá.
Semanas antes de serem assassinados, eles sofreram uma tentativa de assassinato em sua casa. Em novembro de 2010, em uma conferência internacional em Manaus, José Cláudio Ribeiro da Silva expressou preocupação por sua segurança, como resultado de ameaças que havia recebido, e previu que seria assassinado como resultado de seu trabalho. José Cláudio e Maria informaram ao Ministério Público os nomes dos madeireiros de Jacundá e Nova Ipixuna que pressionaram os assentados e tinham invadido suas terras para remover ilegalmente a madeira. Foi aberta uma investigação sobre vários madeireiros da região, e o IBAMA chegou a conduzir pesquisa que detectou a extração ilegal de madeira, o que resultou no fechamento de algumas serrarias ilegais. Apesar de denunciar as ameaças que sofriam às autoridades competentes por reiteradas vezes, eles nunca haviam recebido proteção policial.
Maria do Espírito Santo e seu marido José Cláudio também eram membros do Conselho Nacional de Populações Extrativistas (CNS), uma ONG fundada por Chico Mendes, e estavam lutando pela preservação das florestas na Amazônia. Os assentados viviam e produziam em um terreno de aproximadamente 20 hectares, dos quais 80% eram florestas preservadas.
INVESTIGAÇÕES
Em entrevista coletiva em 20 de julho de 2011, o detetive Sílvio Maúes Batista concluiu que a disputa fundiária por um lote do assentamento comprado ilegalmente pelos autores foi a motivação para o crime, descartando as hipóteses de que o assassinato de Maria do Espírito Santo e José Cláudio tenha sido motivada pela sua defesa dos direitos humanos ou a defesa do meio ambiente através do Projeto Agroextrativista. Segundo a investigação, o fazendeiro José Rodrigues Moreira foi o mandante do duplo homicídio, e o crime foi cometido por Lindonjonson Silva Rocha, irmão do fazendeiro, juntamente com Alberto Lopes dos Santos.
Os acusados tiveram seu julgamento iniciado em 3 de abril de 2013. Após dois dias de julgamento, o Tribunal do Júri de Marabá condenou duas pessoas pelo assassinato de José Cláudio e Maria do Espírito Santo. Lindonjonson Silva Rocha e Alberto Lopes do Nascimento, determinados como autores do crime, foram condenados a 42 anos e oito meses e 45 anos de prisão, respectivamente. O fazendeiro José Rodrigues Moreira, o mandante do assassinato, foi absolvido pelos jurados por falta de provas, e o juiz presidente do júri afirmou que o comportamento dos defensores de direitos humanos de denunciar as ameaças que sofriam aos órgãos competentes havia contribuído para o seu assassinato.
O advogado da CPT (Comissão Pastoral da Terra) José Batista Afonso, que serviu como assistente da acusação no julgamento, explica que o poder político e econômico muitas vezes colaboram para que os réus desse tipo de crime não sejam sequer levados a julgamento. Segundo ele, “havia poucos casos em que isso, de fato, acontecia. E, mesmo quando podemos levar essas pessoas a julgamento, temos dificuldade com a condenação, porque o crime contratado e premeditado é um crime mais difícil de provar do que a execução”. Ele afirma, ainda, que a causa principal dos assassinatos foi deixada em aberto, já que as provas, segundo ele, são claras e reveladoras. “Tudo está bem documentado com provas de testemunhas. Infelizmente, os jurados não as obtiveram”.
Um dia após o término do julgamento, uma testemunha de acusação disse que estava sendo ameaçada e pediu para deixar o estado. Durante o processo judicial, familiares e testemunhas sofreram ameaças de morte e intimidações, inclusive dentro do Tribunal.
Em 12 de agosto de 2014, o Tribunal de Justiça do Pará anulou a sentença que absolveu José Rodrigues Moreira (acusado de ser o mandante do assassinato) e solicitou sua prisão. Todavia, ele continua foragido até o momento atual. Em novembro de 2015, Lindonjonson Silva Rocha, um dos assassinos que estava cumprindo sentença pelo crime fugiu da prisão e continua foragido.
Um novo julgamento sobre o caso foi agendado para 6 de dezembro de 2016, em Belém, para onde o processo foi desaforado por motivos de segurança. O Tribunal do Júri de Belém condenou o fazendeiro José Rodrigues Moreira por sido o autor intelectual dos assassinatos dos defensores, em decisão considerada histórica por defensores e defensoras de direitos humanos da região.
A maioria dos casos de ataques e assassinatos de pessoas defensoras de direitos humanos não conta com uma investigação adequada, e os responsáveis raramente são levados à justiça, demonstrando haver uma impunidade característica na região, onde a grande concentração de recursos nas mãos de poucos traz como resultado uma tensão crônica entre quem tem terra e quem não tem. Isso cria uma situação de violência infelizmente previsível que afeta também a vida daqueles que defendem os direitos humanos. São “mortes anunciadas”, cujos processos de investigação e responsabilização, quando existem, são marcados por irregularidades, tendo em vista o poder político que resulta dessa desigualdade.